Rosa-dos-Ventos

No livro da vida não se volta quando se quer, a página já lida, para melhor entendê-la;
nem pode se fazer a pausa necessária à reflexão.
Os acontecimentos nos tornam e nos arrebatam às vezes tão rapidamente
que nem deixam volver um olhar ao caminho percorrido.
(José de Alencar, in Lucíola)

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sábado, 31 de outubro de 2009

O Pequeno Príncipe - ela havia lhe contado...


XX

Mas aconteceu que o principezinho, tendo andado muito tempo pelas areias, pelas rochas e pela neve, descobriu, enfim, uma estrada. E as estradas vão todas na direção dos homens.

- Bom dia, disse ele.

Era um jardim cheio de rosas.
- Bom dia, disseram as rosas.



 O principezinho contemplou-as. Eram todas iguais à sua flor.

- Quem sois? perguntou ele estupefato.

- Somos rosas, disseram as rosas.

- Ah! exclamou o principezinho.

E ele sentiu-se extremamente infeliz. Sua flor lhe havia contado que ela era a única de sua espécie em todo o universo. E eis que havia cinco mil, igualzinhas, num só jardim!

"Ela haveria de ficar bem vermelha, pensou ele, se visse isto... Começaria a tossir, fingiria morrer, para escapar ao ridículo. E eu então teria que fingir que cuidava dela; porque se não, só para me humilhar, ela era bem capaz de morrer de verdade. . . "

Depois, refletiu ainda: "Eu me julgava rico de uma flor sem igual, e é apenas uma rosa comum que eu possuo. Uma rosa e três vulcões que me dão pelo joelho, um dos quais extinto para sempre. Isso não faz de mim um príncipe muito grande. . ." E, deitado na relva, ele chorou.



O Pequeno Príncipe - só repetem o que a gente diz...


O principezinho escalou uma grande montanha. As únicas montanhas que conhecera eram os três vulcões que lhe davam pelo joelho. O vulcão extinto servia-lhe de tamborete. "De montanha tão alta, pensava ele, verei todo o planeta e todos os homens..." Mas só viu agulhas de pedra, pontudas.



- Bom dia, disse ele inteiramente ao léu.

- Bom dia... Bom dia... Bom dia... respondeu o eco.

- Quem és tu? perguntou o principezinho.

- Quem és tu... quem és tu... quem és tu... respondeu o eco.

- Sede meus amigos, eu estou só, disse ele.

- Estou só... estou só... estou só... respondeu o eco.

"Que planeta engraçado! pensou então. É todo seco, pontudo e salgado. E os homens não têm imaginação. Repetem o que a gente diz... No meu planeta eu tinha uma flor: e era sempre ela que falava primeiro".

O Pequeno Príncipe - no deserto


O principezinho, uma vez na Terra, ficou, pois, muito surpreso de não ver ninguém. Já receara ter se enganado de planeta, quando um anel cor de lua remexeu na areia.
- Boa noite, disse o principezinho, inteiramente ao acaso.
- Boa noite, disse a serpente.
- Em que planeta me encontro? perguntou o principezinho.
- Na Terra, na África, respondeu a serpente.
- Ah!... E não há ninguém na Terra?
- Aqui é o deserto. Não há ninguém nos desertos. A Terra é grande, disse a serpente.

O principezinho sentou-se numa pedra e ergueu os olhos para o céu:
- As estrelas são todas iluminadas... Não será para que cada um possa um dia encontrar a sua? Olha o meu planeta: está justamente em cima de nós... Mas como está longe!
- Teu planeta é belo, disse a serpente. Que vens fazer aqui?
- Tive dificuldades com uma flor, disse o príncipe.
- Ah! exclamou a serpente.

E se calaram.

– Onde estão os homens? repetiu enfim o principezinho. A gente está um pouco só no deserto.
– Entre os homens também, disse a serpente.

O principezinho olhou-a longamente.
- Tu és um bichinho engraçado, disse ele, fino como um dedo...
- Mas sou mais poderosa do que o dedo de um rei, disse a serpente.



 O principezinho sorriu.
- Tu não és tão poderosa assim... não tens sequer umas patas... não podes sequer viajar...
- Eu posso levar-te mais longe que um navio, disse a serpente.

Ela enrolou-se na perninha do príncipe, como um bracelete de ouro:
- Aquele que eu toco, eu o devolvo à terra de onde veio, continuou a serpente. Mas tu és puro. Tu vens de uma estrela...

O principezinho não respondeu.
- Tenho pena de ti, tão fraco, nessa Terra de granito. Posso ajudar-te um dia, se tiveres muita saudade do teu planeta. Posso...
- Oh! Eu compreendi muito bem, disse o principezinho. Mas por que falas sempre por enigmas?
- Eu os resolvo todos, disse a serpente.

E calaram-se os dois.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O Pequeno Príncipe - como se todas as estrelas se apagassem...


- Se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso basta para que seja feliz quando a contempla. Ele pensa: "Minha flor está lá, nalgum lugar..." Mas se o carneiro come a flor, é para ele, bruscamente, como se todas as estrelas se apagassem! E isto não tem importância!







Deste clássico extraio alguns capítulos, cujas palavras, que habitam meus pensamentos desde a adolescência - quando li pela primeira vez este singelo mas profundo pequeno livro -, têm o condão de inquietar a minha mente e, ao mesmo tempo, a apaziguar...



VIII

Pude bem cedo conhecer melhor aquela flor. Sempre houvera, no planeta do pequeno príncipe, flores muito simples, ornadas de uma só fileira de pétalas, e que não ocupavam lugar nem incomodavam ninguém. Apareciam certa manhã na relva, e já à tarde se extinguiam. Mas aquela brotara um dia de um grão trazido não se sabe de onde, e o principezinho vigiara de perto o pequeno broto, tão diferente dos outros. Podia ser uma nova espécie de baobá. Mas o arbusto logo parou de crescer, e começou então a preparar uma flor. O principezinho, que assistia à instalação de um enorme botão, bem sentiu que sairia dali uma aparição miraculosa; mas a flor não acabava mais de preparar-se, de preparar sua beleza, no seu verde quarto. Escolhia as cores com cuidado. Vestia-se lentamente, ajustava uma a uma suas pétalas. Não queria sair, como os cravos, amarrotada. No radioso esplendor da sua beleza é que ela queria aparecer. Ah! Sim. Era vaidosa. Sua misteriosa toalete, portanto, durara dias e dias. E eis que numa bela manhã, justamente à hora do sol nascer, havia-se, afinal, mostrado.



E ela, que se preparava com tanto esmero, disse, bocejando:
- Ah! Eu acabo de despertar... Desculpa... Estou ainda toda despenteada...

O principezinho, então, não pôde conter o seu espanto:
- Como és bonita!

- Não é? Respondeu a flor docemente. Nasci ao mesmo tempo que o sol...

O principezinho percebeu logo que a flor não era modesta. Mas era tão comovente!

- Creio que é hora do almoço, acrescentou ela. Tu poderias cuidar de mim...

E o principezinho, embaraçado, fora buscar um regador com água fresca, e servira à flor.



Assim, ela o afligira logo com sua mórbida vaidade. Um dia por exemplo, falando dos seus quatro espinhos, dissera ao pequeno príncipe:
- É que eles podem vir, os tigres, com suas garras!

- Não há tigres no meu planeta, objetara o principezinho. E depois, os tigres não comem erva.

- Não sou uma erva, respondera a flor suavemente.

- Perdoa-me...

- Não tenho receio dos tigres, mas tenho horror das correntes de ar. Não terias acaso um pára-vento?



"Horror das correntes de ar... Não é muito bom para uma planta, notara o principezinho. É bem complicada essa flor..."

- À noite me colocarás sob a redoma. Faz muito frio no teu planeta. Está mal instalado. De onde eu venho...
Mas interrompeu-se de súbito. Viera em forma de semente. Não pudera conhecer nada dos outros mundos. Humilhada por se ter deixado apanhar numa mentira tão tola, tossiu duas ou três vezes, para pôr a culpa no príncipe:
- E o pára-vento?

- Ia buscá-lo. Mas tu me falavas...

Então ela redobrara a tosse para infligir-lhe remorso.

Assim o principezinho, apesar da boa vontade do seu amor, logo duvidara dela. Tomara a sério palavras sem importância, e se tornara infeliz.
- Não a devia ter escutado - confessou-me um dia - não se deve nunca escutar as flores. Basta olhá-las, aspirar o perfume. A minha embalsamava o planeta, mas eu não me contentava com isso. A tal história das garras, que tanto me agastara, me devia ter enternecido...

Confessou-me ainda:
- Não soube compreender coisa alguma! Devia tê-la julgado pelos atos, não pelas palavras. Ela me perfumava, me iluminava... Não devia jamais ter fugido. Devia ter-lhe adivinhado a ternura sob os seus pobres ardis. São tão contraditórias as flores! Mas eu era jovem demais para saber amar.





IX

Creio que ele aproveitou, para evadir-se, pássaros selvagens que imigravam. Na manhã da partida, pôs o planeta em ordem. Revolveu cuidadosamente seus dois vulcões em atividade. Pois possuía dois vulcões. E era muito cômodo para esquentar o almoço. Possuía também um vulcão extinto. Mas, como ele dizia: "Quem é que pode garantir?", revolveu também o extinto. Se eles são bem revolvidos, os vulcões queimam lentamente, regularmente, sem erupções. As erupções vulcânicas são como fagulhas de lareira. Na Terra, nós somos muito pequenos para revolver os vulcões. Por isso é que nos causam tanto dano.



O principezinho arrancou também, não sem um pouco de melancolia, os últimos rebentos de baobá. Ele julgava nunca mais voltar. Mas todos esses trabalhos familiares lhe pareceram, naquela manhã, extremamente doces. E, quando regou pela última vez a flor, e se dispunha a colocá-la sob a redoma, percebeu que estava com vontade de chorar.

- Adeus, disse ele à flor.

Mas a flor não respondeu.

- Adeus, repetiu ele.

A flor tossiu.

Mas não era por causa do resfriado.

- Eu fui uma tola, disse por fim. Peço-te perdão. Trata de ser feliz.

A ausência de censuras o surpreendeu. Ficou parado, inteiramente sem jeito, com a redoma no ar. Não podia compreender essa calma doçura.

- É claro que eu te amo, disse-lhe a flor. Foi por minha culpa que não soubeste de nada. Isso não tem importância. Foste tão tolo quanto eu. Trata de ser feliz... Mas pode deixar em paz a redoma. Não preciso mais dela.

- Mas o vento...

- Não estou assim tão resfriada... O ar fresco da noite me fará bem. Eu sou uma flor.

- Mas os bichos...

- É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas. Dizem que são tão belas! Do contrário, quem virá visitar-me? Tu estarás longe... Quanto aos bichos grandes, não tenho medo deles. Eu tenho as minhas garras.

E ela mostrava ingenuamente seus quatro espinhos. Em seguida acrescentou:
- Não demores assim, que é exasperante. Tu decidiste partir. Vai-te embora!

Pois ela não queria que ele a visse chorar. Era uma flor muito orgulhosa...



Só se vê bem com o coração ...


... o essencial é invisível para os olhos.
(Antoine de Saint-Exupéry)






O principezinho, uma vez na Terra, ficou, pois, muito surpreso de não ver ninguém. Já receara ter se enganado de planeta, quando um anel cor de lua remexeu na areia.

– Boa noite, disse o principezinho, inteiramente ao acaso.

– Boa noite, disse a serpente.

– Em que planeta me encontro? perguntou o principezinho.

– Na Terra, na África, respondeu a serpente.



– Onde estão os homens? repetiu enfim o principezinho. A gente está um pouco só no deserto.

– Entre os homens também, disse a serpente.





Antoine-Jean-Baptiste-Marie-Roger Foscolombe de Saint-Exupéry (29 de junho de 1900, Lyon - 31 de julho de 1944, Mar Mediterrâneo) foi um escritor, ilustrador e piloto da Segunda Guerra Mundial, terceiro filho do conde Jean Saint-Exupéry e da condessa Marie Foscolombe.

Apaixonado desde a infância pela mecânica, estudou a princípio no colégio jesuíta de Notre-Dame de Saint-Corix, em Mans, de 1909 a 1914. Neste ano da Primeira Guerra Mundial, juntamente com seu irmão François, transfere-se para o colégio dos Maristas, em Friburgo, na Suíça, onde permanece até 1917. Quatro anos mais tarde, em abril de 1921, Antoine inicia o serviço militar no 2º Regimento de Aviação de Estrasburgo, depois de reprovado nos exames para admissão da Escola Naval.

A 17 de junho, obtém em Rabat, para onde fora mandado, o brevê de piloto civil. No ano seguinte, 1922, já é piloto militar brevetado, com o posto de subtenente da reserva. Em 1926, recomendado por amigo, o Abade Sudour, é admitido na Sociedade Latécoère de Aviação, onde começa então sua carreira como piloto de linha, voando entre Toulouse, Casablanca e Dacar, na mesma equipe dos pioneiros Vacher, Mermoz, Guillaumet e outros. Foi por essa época, quando chefiou o posto de Cap Juby, que os mouros lhe deram o cognome de senhor das areias.

Faleceu durante uma missão de reconhecimento sobre Grenoble e Annecy. Recentemente, o alemão Horst Rippert assumiu ser o autor dos tiros responsáveis pela queda do avião e disse ter lamentado a morte de Saint-Exupéry. Em 3 de novembro, em homenagem póstuma, recebeu as maiores honras do exército. Em 2004, os destroços do avião que pilotava foram achados a poucos quilômetros da costa de Marselha. Seu corpo jamais foi encontrado.

Suas obras são caracterizadas por alguns elementos como a aviação e a guerra. Também escreveu artigos para várias revistas e jornais da França e outros países, sobre muitos assuntos, como a guerra civil espanhola e a ocupação alemã da França.

Destaca-se 'O Pequeno Príncipe' (O Principezinho, em Portugal) (1943), romance de grande sucesso de Saint-Exupéry. Escrito durante o exílio nos Estados Unidos, quando teria feito visitas ao Recife.

O Pequeno Príncipe pode parecer simples, porém apresenta personagens plenos de simbolismos: o rei, o contador, o geógrafo, a raposa, a rosa, o adulto solitário e a serpente, entre outros. O personagem principal vivia sozinho num planeta do tamanho de uma casa que tinha três vulcões, dois ativos e um extinto. Tinha também uma flor, uma formosa flor de grande beleza e igual orgulho. Foi o orgulho da rosa que arruinou a tranqüilidade do mundo do pequeno príncipe e o levou a começar uma viagem que o trouxe finalmente à Terra, onde encontrou diversos personagens a partir dos quais conseguiu repensar o que é realmente importante na vida.

O romance mostra uma profunda mudança de valores, e sugere ao leitor o quão equivocados podem ser os nossos julgamentos, e como eles podem nos levar à solidão. O livro leva à reflexão sobre a maneira pela qual nos tornamos adultos, entregues às preocupações diárias e esquecidos da criança que fomos e somos.

Livros
L'Aviateur (O aviador) - 1926
Courrier Sud (Correio do Sul) - 1929
Vol de Nuit (Vôo Noturno) - 1931
Terre des Hommes (Terra dos Homens) - 1939
Pilote de Guerre (Piloto de Guerra) - 1942
Le Petit Prince (O Pequeno Príncipe) - 1943
Lettre à un Otage - 1943/1944

Póstumos
Citadelle - 1948
Lettres de Jeunesse - 1953
Carnets - 1953
Lettres à sa Mère - 1955
Écrits de Guerre - 1982
Manon, Danseuse - 2007

(Fonte: Wikipédia) 



"Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós". Antoine de Saint-Exupéry



domingo, 18 de outubro de 2009

Tarde no parque


Em uma tarde de sol, que estava um tanto tímido, aproveitei para dar uma caminhada no Parque Farroupilha da capital gaúcha e fotografar.







Estou a fotografar a paisagem... mas algo que eu não vira apareceu na foto, algo escuro se movimentando na água.



Um cão nadador...





Seu dono de estimação (como diria uma querida amiga minha) jogava um galho na água, e o cão, sem hesitar, saltava na água (na verdade era necessário que o seu dono apenas fizesse menção de atirar o galho na água para que o nadador já se jogasse!). E cada salto seu era 'splash' bem forte...



E na outra margem, há um imitador....







Entretendo-me com os nadadores, nem percebi que tinha companhia - adorável companhia!









E mais outra, também adorável!















O Pássaro Cativo

Armas, num galho de árvore, o alçapão;
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.

Dás-lhe então, por esplêndida morada,
A gaiola dourada;
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo:
Porque é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste, sem cantar?

É que, crença, os pássaros não falam.
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:

“Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que a voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro
Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores,
Sem precisar de ti!

Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola
De haver perdido aquilo que perdi ...
Prefiro o ninho humilde, construído
De folhas secas, plácido, e escondido
Entre os galhos das árvores amigas ...

Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pompas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes? Solta-me covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade:
Não me roubes a minha liberdade ...
Quero voar! voar! ... “
Estas cousas o pássaro diria,
Se pudesse falar.

E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição:
E a tua mão tremendo, lhe abriria
A porta da prisão...
(Olavo Bilac - Poesias Infantis)







Minha companhia não me deixou até eu ir embora, para lá e para cá, com sua meiguice e delicadeza.







Leveza
Leve é o pássaro:
e a sua sombra voante,
mais leve.
E a cascata aérea
de sua garaganta,
mais leve.
E o que se lembra, ouvindo-se
deslizar seu canto,
mais leve.
E o desejo rápido
desse mais antigo instante,
mais leve.
E a fuga invisível
do amargo passante,
mais leve.
(Cecília Meireles)





sábado, 17 de outubro de 2009

Saudade


Estou com saudades de te sorrir...
Olho em volta, desejando saber que logo soltarei meu sorriso.


A memória voa
O suspiro se desprende
Os minutos pairam no ar
Mas o tempo morre e desaparece
E o silêncio diz teu nome

Não finda porém
O tempo em que te espero
Que assiste ao leito que as lágrimas
Nascendo do peito formam
Correndo pelo corpo que te anseia

Os sonhos deito nos versos
Tolos, mas que me acalentam
Nesse desnorte provocado pela tua perda
Pois as lembranças não findam
Remetendo a ti

Alívio não há nem é querido
Apenas o coração desejoso
De ver-te novamente
De ter-te novamente
Esperançoso







Saudade

“...Saudade é solidão acompanhada,
É quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado
que ainda não passou,

É recusar um presente que nos machuca,
É não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe
o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
É a dor dos que ficaram para trás,
É o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
Aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
Não ter por quem sentir saudade,
Passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido...”

Pablo Neruda



Ao falar em arte: parte IV




As criações de M.C. Escher fascinam-me, sugam-me para um universo à parte, um mundo irreal, mas que parece real.
Já a arte de Sebastião Salgado revela a realidade, que mais parece irreal.

Sua obra África é a que mais me atrai, talvez justamente por retratar a África... Quando me perguntavam, quando criança, qual país eu gostaria de conhecer, a resposta era sempre a mesma, sem hesitar: África. Hoje, se fizerem essa indagação, a resposta será a mesma: África!




Lembro-me das primeiras fotos de Sebastião Salgado que vi.
Eu não tinha certeza de que eram fotografias.


A beleza da sua arte bem como a realidade que elas revelam nos sensibilizam, com o condão de, por vezes, nos envergonhar de sermos seres humanos...





Na Revista Cultura (edição 06 - janeiro de 2008) foi publicada uma entrevista com o 'Fotógrafo andarilho de um planeta não revelado', da qual cito um trecho.
"Quando você está em uma tribo lá no interior do Brasil, no fundo do Amazonas, vê que ela não tem nada para aprender aqui com essa sociedade. O que é essencial, já sabíamos há 5 mil anos. Já tínhamos antibióticos. Nós apenas sistematizamos e transformamos em outros componentes químicos para aumentar a quantidade, mas a base já havia. Antiinflamatório já havia. Os ianomâmis lá do interior de Roraima têm uma noção de geologia perfeita. Eles são seminômades, só vão voltar para um local em que haviam se fixado 100 anos depois, quando a floresta estiver refeita. Os problemas que temos de amar, de sofrer, de ciúme, são os mesmos. O que é interessante na preservação dessas partes do mundo é a preservação da nossa referência. Isso é muito importante. É quase impossível fazer uma projeção futura sem olhar para trás. É importante preservar a natureza, os grandes sistemas de água. O planeta não está em perigo, ele é um velho de 6 bilhões de anos, e daqui a 6 bilhões de anos ainda vai estar aqui. Quem está em perigo somos nós, nossa espécie. A questão é que devemos ser sábios o suficiente e refazer o que desfizemos. Só isso. A idéia desse projeto Gênesis é buscar essas áreas, ajudar a fazer uma nova apresentação do planeta. Minhas fotografias não têm importância. Mas as minhas fotografias somadas a este artigo, mais as informações da televisão, as organizações que estão militando, as instituições de boa vontade, passam a ser um elemento dentro disso tudo. Nos distanciamos demais do planeta. Há o fato de termos urbanizado, de nos considerarmos o único animal racional – o que é uma mentira, cada espécie tem seu racionalismo. Hoje, se discute a distribuição de renda, a destruição da floresta tropical, a poluição do oceano, a aids, tudo o que se quiser, e não encontramos soluções. Estamos meio perdidos. Nossa espécie está desencontrada. Para mim, o fator principal é que perdemos o contato com o planeta e a idéia de que somos natureza. Acreditamos que somos seres diferentes, privilegiados, com direito a consumir, destruir. Não temos esse direito. Tudo o que é destruído é um déficit. E esse déficit, outro vai pagar por você."


Caminhada nas Montanhas (Equador - 1982)


Garimpeiros trabalhando (Serra Pelada - 1986)


Índia - 1990


Pôr-do-sol (Patagônia - 1994)


Gigantes (Patagônia - 2005)


Refugiados de Ruanda (Tanzânia - 1994)


Tanzânia - 1994


Península Valdés (Argentina - 2004)


Galápagos (Equador - 2004)


Patagônia - 2005


Antártica -2005


Antártica - 2005


Delta de Okavana (Botsuana - 2007)

Sebastião Salgado nasceu no dia 8 de fevereiro de 1944 em Aimorés, Minas Gerais, Brasil. Vive em Paris. Economista de formação, começa sua carreira de fotógrafo em Paris em 1973. Trabalha sucessivamente com as agências Sygma, Gamma e Magnum Photos até 1994 quando, junto com Lélia Wanick Salgado fundam a agência de imprensa fotográfica, Amazonas images, exclusivamente devotada à seu trabalho.
Viaja em mais de 100 países para projetos fotográficos que, além de inúmeras publicações na imprensa, foram apresentados em forma de livros, tais como : Outras Américas (1986), Sahel, l’Homme en détresse (1986), Trabalhadores (1993), Terra (1997), Êxodos e Retratos de Crianças do Êxodo (2000) e Africa (2007). Exposições itinerantes destes trabalhos foram e continuam a serem apresentadas internacionalmente.



Ao mencionar a arte fotográfica de Sebastião Salgado, não pude deixar de lembrar fotos que ficaram impressas na minha memória, como provavelmente na memória de todos aqueles que as viram.
Uma delas é a que retrata uma menina afegã, de Steve McCurry.




Outra... bem.. essa me marcou muito... do fotojornalista sul-africano Kevin Carter, retratando em 1993 o Sudão, país atingido pela fome. Além disso, choca o fato de Kevin Carter ter se suicidado no ano seguinte, deixando registros em seu diário sobre sua depressão, falta de dinheiro e as memórias de dor, morte, medo, crianças com fome extrema...


Fontes:
Steve McCurry
Kevin Carter